Pular para o conteúdo principal

STF caminha para alterar regra do cálculo das sobras

O STF iniciou julgamento em plenário virtual, sobre três casos que questionam os critérios para distribuição das sobras das cadeiras no Congresso, na verdade, a chamada terceira fase de distribuição das vagas das sobras eleitorais; Os partidos que acionaram a Corte Maior pretendem que sejam incluídas todas as legendas que participaram das eleições, independentemente do quociente eleitoral alcançado.

As ações ficaram sob a relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, que apresentou voto, considerando que a norma atual restringe a pluralidade dos partidos políticos, limitando a eleição de seus representantes, notadamente no sistema proporcional, violando os fundamentos de nosso Estado Democrático de Direito. Para o relator, todas as legendas e seus candidatos devem participar da distribuição das cadeiras remanescentes (sobra da sobra), independentemente de terem alcançado a exigência do percentual do quociente eleitoral, que se constituiria em uma cláusula de barreira, na prática; Para Lewandowski, no entanto, a norma só deve valer à partir de 2024.

O objeto das ações é atacar a validade do inciso III do artigo 109 do Código Eleitoral, alterado pela Lei Federal n. 14.211/21, normatizada através da Resolução n. 23.677/21, do TSE. A norma diz que o partido, para ter direito a participar da distribuição das sobras das cadeiras destinadas ao cargo de deputado Federal, deve alcançar pelo menos 80% do quociente eleitoral, e que o candidato que tenha, no mínimo, obtido 20% do quociente em sua votação nominal.  Não atendidas as duas condições, as cadeiras restantes são distribuídas aos partidos que apresentarem as maiores médias, mas a norma atual restringiu que a maior média somente deve ser calculada entre os partidos que tenham obtido pelo menos 80% do Quociente Eleitoral.

Desde o Código Eleitoral de 1932, reiterado pelo de 1950 e depois, 1965 (Lei n. 4737), o seu artigo 106 estabeleceu que na fase inicial de distribuição de vagas, estas são conferidas pela divisão destas entre os partidos que alcançaram ou ultrapassaram o quociente eleitoral, por sua vez calculado no resultado do número de votos válidos dividido pelo número de cadeiras.

Lembremos que a Lei n. 12.211/21 alterou o Código Eleitoral e a Lei 9504/97 (a Lei das Eleições), para recepcionar em seu conteúdo da vedação constitucional de coligações nas eleições proporcionais e para fixar critérios para a participação dos partidos e dos candidatos na distribuição das vagas.

Pela Lei atual, aplicada inclusive no pleito de 2022, nesta 2ª fase de distribuição das vagas, quando não houver mais partidos que tenham alcançado os dois requisitos da fase anterior, os lugares são preenchidos basicamente, com duas exigências: o partido deve ter obtido pelo menos 80% do Quociente Eleitoral e deve ter candidato com votação igual ou superior a 20% do Quociente Eleitoral.

Na 3ª fase de distribuição das vagas, quando não houver mais partidos que tenham alcançado os dois requisitos da fase anterior,  na chamada sobra das sobras, essas cadeiras serão distribuídas aos partidos que apresentarem as maiores médias. A obtenção da média se apresenta a partir da divisão do número de votos válidos atribuídos a cada partido pelo número de lugares por ele obtido, mais um. Esse processo se repete até se preencher todas as vagas restantes. Quem não atender, nesta fase,  de acordo com o art. 109, estas condições, não pode, participar da distribuição das sobras.

No entanto, e aqui está o ponto controverso, segundo Resolução TSE 23.677/21, a maior média somente deve ser calculada entre os partidos que tenham obtido o primeiro requisito da fase anterior, ou seja, pelo menos 80% do Quociente Eleitoral. É esta restrição que está sendo questionada no STF. Na ADIn 7.228, o partido Rede Sustentabilidade alega que, a seu ver, as alterações instituíram uma espécie de cláusula de barreira para a disputa das sobras eleitorais. O partido sustenta que, em 2022, ocorreram as primeiras eleições com barreira e sem coligações, o que pode significar o "início do fim", por vias inconstitucionais, do "sistema eleitoral proporcional, com reais e efetivas disfunções de inúmeras ordens".

As mudanças, para a Rede, parecem conduzir a uma espécie de "distritão à força", pois o sistema só poderia ser implementado por meio de emenda à Constituição e, em 2021, foi rejeitado pela Câmara dos Deputados. Os partidos Podemos e PSB ajuizaram a ADIn 7.263 alegando erro na forma de cálculo adotada pela Justiça Eleitoral e sustentam que isso pode levar a distorções do sistema proporcional, como, por exemplo, um partido ficar com todas as vagas da Câmara, caso seja o único a alcançar o quociente eleitoral, para estes partidos, a regra fere princípios constitucionais como o pluralismo político, o Estado Democrático de Direito, a igualdade de chances, a soberania popular e o sistema proporcional. 

Na ADIn 7.325, o Partido Progressista alega que as balizas "contribuem para uma sobrerrepresentação de partidos que já gozam de uma maior representatividade e que se estruturam em torno de candidatos com maior projeção pessoal, em detrimento de agremiações que possuem uma maior dispersão de votos". Para o partido, a criação de critério diferenciado de exigência de votação mínima ofende tambem, a isonomia, a proporcionalidade e atenta contra o pluralismo político e alógica do sistema representativo.

Ao analisar o caso, o Relator Lewandowski ressaltou que toda e qualquer norma que tenha por escopo restringir a pluralidade dos partidos políticos, limitando a eleição de seus representantes, notadamente no sistema proporcional, viola os fundamentos de nosso Estado Democrático de Direito.  Importante, o ministro ainda acrescentou que a norma pode excluir do Legislativo cidadãos com "altíssima densidade eleitoral em detrimento de candidatos com baixa representatividade", sendo inaceitável que o STF chancele interpretação da norma que permita "tamanho desprezo ao voto", mormente em favor de candidato com baixíssima representatividade e, conforme os critérios empregados na segunda fase, pertence à agremiação já favorecida pela atual forma de cálculo.

"Por essas razões impõe-se que, após a aplicação da cláusula dupla de desempenho 80/20 na segunda fase do escrutínio eleitoral, as cadeiras que eventualmente sigam desocupadas sejam distribuídas entre todos os partidos que obtiveram votos no pleito, mediante uma interpretação conforme à Constituição do § 2° do artigo 109 do CE e da regra de distribuição abrigada no inciso III do artigo 109 do CE (distribuição remanescente)."

Assim, o ministro julgou procedente a ação para dar interpretação conforme à Constituição ao § 2° do art. 109 do Código Eleitoral de modo a permitir que todas as legendas e seus candidatos participem da distribuição das cadeiras remanescentes (3ª fase), independentemente de terem alcançado a exigência dos 80% e 20% do quociente eleitoral, respectivamente. O ministro votou, ainda, para declarar a inconstitucionalidade do artigo 111 do Código Eleitoral, aplicando os parâmetros da 2ª e 3ª fases quando nenhum agremiação/federação atingir o quociente eleitoral.

Interpretando o dispositivo constitucional, o STF, em sede de repercussão geral, já firmou tese no sentido de que "as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral ou logo após o seu encerramento, impliquem mudança de jurisprudência, não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior" (Tema 564); afinal, diante disso, Lewandowski votou para atribuir o efeito ex nunc à decisão, de modo que surtirá efeitos somente a partir do próximo pleito (2024).

Caso a alteração seja chancelada em definitivo pelo STF, nas Casas Legislativas com maior número de membros terão acesso mais facilitado a legendas de porte médio.





Comentários

Postagens Mais Visadas do Blog

AS CANDIDATURAS INDEPENDENTES: UMA DISCUSSÂO NECESSÁRIA

Nas discussões da reforma política, em 2015, reapareceu uma discussão necessária, acerca da possibilidade do lançamento e registro de candidatura avulsas, ou sem vínculo partidário. No Brasil, como veremos, é norma constitucional o vínculo, diferentemente da maior parte dos países em todo o mundo. Nosso país adota o vínculo obrigatório aos partidos desde a Lei Agamenon Magalhães, e tanto o Código Eleitoral e os textos constitucionais vem mantendo tal obrigação, agora presente no texto de 1988 como uma das condições de elegibilidade. O constitucionalista Jose Afonso da Silva destaca o fato dos partidos serem os canais por onde se realiza a representação política do nosso povo, não se admitindo candidaturas avulsas; já Celso Ribeiro Bastos fala da dependência visceral da democracia dos partidos políticos, muito embora, quase que prevendo a atual discussão, Manoel Gonçalves Ferreira Filho advertia que os partidos deixam de cumprir sua função quando são dominados por oligarquias, quan

NOVAS REGRAS PARA AS ELEIÇÕES 2020

Praticamente, não há alterações na legislação eleitoral em 2020, a não ser algumas poucas, na propaganda e financiamento. Mas é curioso ver cursos e profissionais "vendendo" a ideia de como se as mudanças de 2015 e 2017 fossem novas. A grande inovação na verdade, é a aplicação e vigência da proibição das coligações proporcionais, o que já era conhecido desde 2017, com o advento da Emenda Constitucional n. 97; Mudam a estratégia, a tática eleitoral e diminuirá certamente o número de partidos e candidatos em 2020. Destaco que o número de candidatos não se modificou. Continua em 150% do número de vagas a preencher. Sendo que, no caso de fração igual a 0,5, arredonda-se para cima. E a interpretação para as vagas de gênero (em geral, de mulheres) de 30% é no sentido de que, em caso de fração, igual a 0,1 ou abaixo mesmo de 0,5%, o número se arredonda para cima. No caso de 17 candidatos, o número da cota será de 6 (arredondado de 5,4).  A regra de 200% para "coligação p