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O Fenômeno da troca de nomes dos Partidos Brasileiros

Nos últimos dez anos, o quadro político brasileiro observa um curioso fenômeno pelo qual diversos partidos promoveram, de alguma forma, a troca de sua denominação, sigla, sendo em decorrência da imposição pela mudança programática que sofreram, fusões ou incorporações, o abandono da expressão "partido", ou simplesmente uma jogada mercadológica de marketing político. É o que passaremos a analisar. O fenômeno ainda abarca outra questão: o da criação de novos partidos, com nomes dissociados das siglas ou rotulações ideológicas mais tradicionais aplicadas aos partidos, como "Liberal", "Conservador", "Socialista", "Trabalhista", etc.

O fenômeno vem ocorrendo como uma verdadeira onda, levando um partido após o outro a rever suas antigas denominações e modernizar sua face ao público: começou com o Partido da Frente Liberal (PFL), que nasceu em 1985 da dissidência do PDS oficialista, por sua viz originado da Frente Liberal que possibilitou a vitória de Tancredo Neves no colégio eleitoral em 1984. O PFL, desgastado após alguns anos de poder, e vinculado à imagem de velhos políticos e oligarquias nordestinas, como a de Antonio Carlos Magalhães na Bahia, ao ver seus votos e números de parlamentares minguar, reinventou-se em 2007 como "Democratas", uma nova agremiação mais centrista, suave, adotando novos símbolos, e tem tido relativo sucesso em uma recuperação eleitoral mais acentuada em 2018. Foi a primeira vez que um partido brasileiro pós redemocratização abandonou a denominação "Partido". 

Na verdade, no fim do bipartidarismo, bem como da ARENA e o MDB, e a mitigação das leis eleitorais que permitiram a criação de novos partidos, uma mudança introduzida na Lei dos Partidos de então (Lei n. 5682/71, art. 5o, §1o, introduzido pela Lei n. 6767/79) obrigando as agremiações políticas a utilizar a denominação inicial "Partido". O entendimento que se seguiu, mesmo alguns anos após a promulgação da nova Constituição de 1988, e a adoção da nova Lei dos Partidos (Lei n. 9096/95), fez com que a obrigatoriedade caisse em desuso, prevalecendo a autonomia dos partidos para estabelecer sua denominação livremente. 

Não se sabe ao certo porque os militares quiseram, em 1979 no processo de redemocratização, impelir a utilização da palavra "partido". Mas observadores e comentaristas políticos da época especularam dizendo que impedia-se que o MDB, popular que já estava, e consolidado no imaginário do eleitorado, permanecesse como um Bloco imbativel eleitoralmente. Ulysses Guimarães e outros então, propuseram simplesmente adicionar o "P", e fundar o PMDB em 1980; outros entendiam que o processo impediria um racha no voto mais liberal-conservador, partilhado pelo sucedâneo da ARENA, o PDS, com a reorganização da UDN (União Democratica Nacional), opção de muitos políticos governistas de então. A manobra permitiu ao PDS continuar forte, conforme se pretendia pelos estrategistas da época, como o General Golbery do Couto e Silva.

Mas o fato é que após os Democratas em 2007 inaugurarem a possibilidade, novos partidos que se organizaram, optaram pela nova hipótese, e daí vimos "O movimento de abandonar o termo “partido” - Dessas quatro siglas, três foram fundadas de 2013 para cá: a Rede Sustentabilidade, o Solidariedade e o Novo." Outras, por sua vez,como o já citado PMDB, tentou aproveitar a onda e tentar relembrar ao eleitorado seu histórico, alterando em pleno Governo Michel Temer, no final de 2017, tornando a sua denominação e sigla anterior: MDB, sendo considerado por muitos um movimento tardio de resgate - tanto é que alguns já defendem uma ulterior modificação para ... "Movimento".

O desgaste dos partidos, ou simplesmente dos seus programas gerou outras trocas: Em 2017, o velho e redivivo Partido Trabalhista Nacional (PTN) trocou seu nome para... Podemos! A opção para uma denominação mais neutra, menos comprometida valeu uma nova e maior bancada, sendo o nome sem correspondência anterior no quadro brasileiro, e sem correspondência com o Podemos boliviano, direitista, ou o Podemos espanhol, esquerdista. Quase igual trajetória cumpriu o tambem centrista e moderado Partido Trabalhista do Brasil (PTdoB), dissidência do PTB, que no mesmo ano optou pelo neutro e simpático nome de AVANTE - que tambem colheu bons frutos eleitorais no ano seguinte. Tanto o Podemos e o Avante mantiveram alguns postulados, mas investiram na reapresentação programática tambem; como um jornalista observador do Estado de SP comentou: "os partidos passaram a usar como nomes "slogans", ou "palavras de ordem", como se fosse movimentos, perdendo a percepção de estática.


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Fotos: Avante e Podemos (2017)

Ainda no mesmo ano, o PSDC de Eymael, ex integrante do saudoso Partido Democrata Cristão (PDC), passou simplesmente a denominar-se "Democracia Cristã", livrando-se do tambem do termo "Partido", sem qualquer alteração programática, assim como o quase identicamente o PP, o mais envolvido nos escândalos de corrupção na Operação Lava Jato, decidiu denominar-se simplesmente como "Progressistas"; Por último, em 2018, em um mimetismo inesperado, o ecológico PEN se transmutou em "Patriotas", avaliando que hospedaria em seus quadros o deputado Jair Bolsonaro, que não permaneceu na legenda, e terminou se elegendo Presidente pelo Partido Social Liberal (PSL).

O movimento ou onda ainda não acabou, aparentemente, com a recente decisão em 2019, do PPS (Partido Popular Socialista, que por sua vez já havia passado por uma mutação programática, após o Congresso do Partido Comunista Brasileiro - PCB - de 1992, concluir pela adoção de uma plataforma "pós comunista"), de se denominar "Cidadania", para ampliar a absorção de novos movimentos sociais, e da cidadania um pouco refratários ao antigo caráter "socialista" da legenda.

Os tucanos do PSDB, em conflito entre a velha guarda enfraquecida pelos escândalos de corrupção e caixa 2, mais ligada ao ideário social democrata, e egressa da esquerda, com os quadros mais novos e claramente de centro-direita, que emergiram nos anos nos quais o PSDB foi marcadamente a legenda mais antipetista, avaliam seriamente se alteram sua denominação, ou não. Por fim, os novos dirigentes do PSDB já alinhados ao Governador João Dória preferiram chamar a sigla de "Novo PSDB".  Por fim, 2019 ainda aguarda uma última mudança: o Partido da República (PR) de Waldemar da Costa Neto, tambem fruto de desgaste político nos últimos anos deve voltar a se chamar Partido Liberal (PL), remetendo ao período no qual foi fundado, pelo saudoso deputado Alvaro Valle. O PR foi fruto da fusão entre o PL da primeira versão, e o PRONA do deputado Enéas Carneiro.  O PRB (não custa lembrar, organizado basicamente por dirigentes da Igreja Universal, como PMR - Partido Municipalista Republicano, mas logo trocado para PRB imediatamente após o registro no TSE) tambem apostou na simplificação, em 2019, anunciando que tambem mudará, com a nova e denominação "Republicanos". A justificativa é mais clara: ex-aliado do petismo, o partido agora se proclama como agremiação de centro-direita, justificando uma nova fase, mais alinhada ao novo governo de direita.

Não custa lembrar que o título de campeão da troca de nomes no quadro partidário brasileiro pertence ao PTC (Partido Trabalhista Cristão) de Daniel Tourinho, que fundou o PJ (Partido da Juventude), em 1985, e que alterou o nome depois para PRN (Partido da Reconstrução Nacional), para desembarcar na vitoriosa campanha de 1989 de Fernando Collor, e com o posterior desgaste do período "collorido", passou a se chamar PTC em 2000, para buscar uma nova fase; Mais uma vez, agora em 2019, anuncia-se outra troca de nome - desta vez, seguindo a onda de denominação-movimento, para "Agir". O Presidente Nacional da legenda é o mesmo - Daniel Tourinho, desde 1985.

Como vimos, o fenômeno não se prende ao fato mais claro, de deixar para trás o desgaste de alguns anos, o envolvimento com algum escândalo, como os da Operação Lava Jato, ou simplesmente o desejo do marketing político, tornando uma proposta mais palatável, mas há outros fatores, como o desejo simples de se livrar do termo "Partido", que no Brasil ficou ligado a um período político ultrapassado, ou ao desejo de mostrar ao eleitorado novas concepções ideológicas, ou mesmo uma mudança programática mais profunda, como trocar de roupa, sendo o motivo mais nobre, como a evolução de um ideal partidário, reflexão de novos tempos, uma mudança de orientação ideológica, ou finalmente, uma operação mais oportunista, para agasalhar uma candidatura de ocasião, ou ser uma maquiagem, a nova embalagem da mesma coisa.

O fato é que o movimento, tal qual uma onda, no sentido de que é preciso se reapresentar ao eleitorado, ou se livrar de uma embalagem indesejada, para marcar a superação de um momento ruim, ou ainda, marcar uma reorientação ideológica ou política, e o desgaste da imagem dos partidos políticos e seu papel fez com que, a partir de 2007, acelerando-se e propagando-se em boa parte das legendas brasileiras após 2016, estendendo-se o fenômeno a 2019, os partidos trocam de nome, orientação, e tentam se parecer com movimentos da sociedade civil, ou mais dinâmicos que até agora.

Afinal, o mesmo processo histórico não se prende ao caso brasileiro, mas há exemplos recentes em outros países, como na Itália, a antiga "Lega Lombarda", passou a se chamar "Liga Norte" (1991), para se ampliar, e mais recentemente, "LIGA" (2016), transformando-se no maior partido italiano de caráter conservador, populista de direita, chegando a liderar o governo, com o premier Salvini, em um exemplo bem sucedido de troca de denominação, para ampliar o eleitorado; ainda na Italia, o antigo Partido Comunista (PCI), tambem aderiu ao pós-comunismo, quando passou-se a chamar PDS (Partito Della Sinistra, Partido da Esquerda), sendo no bojo do fenômeno mais recente, a se chamar simplesmente Partido Democrata (PD), englobando centristas, democratas liberais, social democratas e ex comunistas, em uma frente mais ampla contra a direita italiana. Na França, em outro exemplo da mesma onda, o RPR gaullista (depois UMP em 2002) passou a se chamar LR (Les Republicains, "Os Republicanos"), em 2015; e a Frente Nacional, de extrema direita, em um esforço de suavizar sua antiga imagem radical, passou a se chamar Reunião Nacional ("Rassemblement National - RN), em 2018.


Interessantes artigos foram produzidos no calor do momento, como o do Estado de SP, e o da Gazeta do Povo, do Paraná, em 2017; em: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,partidos-mudam-de-nome-por-slogans,70001940930 ou https://www.gazetadopovo.com.br/politica/republica/a-nova-onda-do-momento-partidos-nao-querem-ser-partidos-entenda-por-que-2pyh9y33uy2j7ucloi4p6tb2p/  




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