O TSE, em 9 de maio de 2019, decidiu, por maioria, entender novamente que as gravações ambientais procedidas nos autos de processos de corrupção eleitoral são consideradas provas válidas. A decisão terá validade temporal a partir de 2016, e vincula-se aos novos casos que serão apreciados pela Corte. O processo julgado referia-se a um vereador do município de Timbó Grande (SC), fixando-se a seguinte tese: “(..) Admite-se, em regra, como prova do ilícito eleitoral, a gravação ambiental feita por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro e sem prévia autorização judicial, seja em ambiente público ou privado”. A decisão dizia respeito ao vereador Gilberto Massaneiro, que teve uma conversa gravada ao oferecer vantagens a uma eleitora em troca de seu voto.
Importante destacar que no julgamento, o voto-vista do Ministro Barroso reconheceu não ter havido o chamado "flagrante preparado", que afastaria a incidência do ilícito, que tem o caráter da espontaneidade, de se ofertar algo afim de obter votos, ou com o intuito de vantagem eleitoral, de obter votos ou abstenção para favorecer candidatura específica; No caso, do presente julgamento, tambem destaco que foi afastado o abuso de poder, conquanto a oferta a apenas uma eleitora não tem a "aptidão para afetar a normalidade do pleito e atrair as sanções da prática de ato abusivo."
A divergência ficou por conta dos ministros Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos, que se posicionaram pela invalidade da prova obtida por gravação ambiental, que mantiveram o entendimento pelo qual a prova obtida por meio de escuta sem o conhecimento da outra parte não pode servir de prova, mas a tese vitoriosa foi mesmo a trazida pelo MP Eleitoral, “A conclusão a que chegou a Corte Regional quanto à licitude da gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem o conhecimento do outro, ajusta-se com fidelidade à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”, destacou o vice-procurador-geral Eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros, em parecer enviado ao TSE. Segundo ele, o próprio STF, em recurso com repercussão geral reconhecida, já admitiu que a gravação ambiental é meio legal de obtenção de provas, ainda que realizada sem prévia autorização judicial; Adotar interpretação diferente a essa, segundo o vice-PGE, “representaria violação direta à legislação processual, que impõe aos tribunais o dever de uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”.
Sobre a iterativa jurisprudência sobre o tema, seguindo entendimento do STF da validade da gravação ambiental como prova em processo criminal, eis que o TSE na verdade já havia firmado posição sobre a sua admissibilidade, senão vejamos:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PENAL. CRIME
DE CORRUPÇÃO ATIVA DE TESTEMUNHA. GRAVAÇÃO AMBIENTAL
REALIZADA POR UM DOS INTERLOCUTORES. POSSIBILIDADE.
REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO NO RE 583.937-
QO-RG. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. FLAGRANTE PREPARADO.
REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 279/STF.
INCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E
356/STF.
[...]
"2. É lícita a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o
conhecimento do outro, podendo ela ser utilizada como prova em
processo judicial, conforme reafirmação da jurisprudência desta Corte
feita pelo Plenário nos autos do RE n. 583.937-QO-RG, Rei. Min. Cármen
Lúcia, Segunda Turma."
[...]
[AgRegRE n. 742.192, de 15.10.2013, Rei. Min. Luiz Fux - Grifou-se],
e ainda:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. GRAVAÇÃO
AMBIENTAL FEITA POR UM INTERLOCUTOR SEM CONHECIMENTO DOS
OUTROS: CONSTITUCIONALIDADE. AUSENTE CAUSA LEGAL DE SIGILO
DO CONTEÚDO DO DIÁLOGO. PRECEDENTES.
1. A gravação ambiental meramente clandestina, realizada por um dos
interlocutores, não se confunde com a interceptação, objeto cláusula
constitucional de reserva de jurisdição.
2. É lícita a prova consistente em gravação de conversa telefônica realizada por
um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, se não há causa legal
específica de sigilo nem de reserva da conversação. Precedentes.
3. Agravo regimental desprovido [AgR-AI n. 560223/SP, Rei. Min. Joaquim
Barbosa, DJE de 29.4.2011 - Grifou-se],
destacamos ainda:
AÇÃO PENAL. Prova. Gravação ambiental. Realização por um dos
interlocutores sem conhecimento do outro. Validade. Jurisprudência
reafirmada. Repercussão geral reconhecida. Recurso extraordinário provido
Aplicação do art. 543-B, § 3o
, do CPC. É lícita a prova consistente em
gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento
do outro [RE n. 583 937, Rei. Min. Cezar Peluzo, DJE de 18.12.2009 -
Grifou-se].
Tal diretriz permaneceu inalterada até o julgamento, em 1°.7.2011, do Agravo Regimental no
Recurso Especial de n. 36.359, em voto da lavra do Min. Gilson Dipp, quando então
decidiu pela imprestabilidade da gravação ambiental, ao principal argumento de que,
conquanto lícita a prova, poderia servir de mecanismo à "deturpação da lisura da
campanha ou injusta manipulação contra os participantes da competição eleitoral".
Por certo tempo, pois, manteve sua posição de divergência, ao assentar
que essa espécie de prova seria admissível apenas se precedida da devida
autorização judicial ou para defender direito do próprio interlocutor em matéria penal,
sob pena de violação à privacidade e à intimidade das pessoas que, de boa-fé,
travaram os diálogos gravados.
Referida orientação, ademais, teve ampla e irrestrita aplicação aos feitos
originários das Eleições de 2012, ao fundamento de que "[...] a tese da ilicitude da
gravação ambiental realizada por um dos interlocutores esta/na/ consolidada na
jurisprudência do TSE [...]" relativamente àquele pleito, "[.. ] de modo que eventual
modificação deve[r/a/ incidir em pleitos futuros, em respeito ao princípio da
segurança jurídica, implicitamente previsto no art. 16 da Constituição Federal",
[...] de modo a evitar eventuais casuísmos após ultimado o processo eleitoral [...]
[AgRegREspe n. 453-07, de 25.2.2016, Rei. Min. Gilmar Mendes - grifou-se].
O Tribunal Superior Eleitoral na verdade, ao reexaminar o tema condicionou sua
repercussão, porém, aos certames eleitorais após o ano de 2012, demarcando claramente o pleito de 2016.
A Corte tem, igualmente, realizado o juízo de admissibilidade desta espécie de
prova, levando em consideração o meio em que produzida, se privado ou público, e o
modo de sua obtenção.
A primeira hipótese se dá quando a gravação é realizada em local privado
e reservado a determinadas pessoas, restrito a outros interessados. A segunda,
quando o registro é obtido em ambiente público, de acesso livre a qualquer um do
povo.
Estabelecida a diferenciação, mediante a análise concreta do caso, tem o
Tribunal Superior Eleitoral se inclinado a reconhecer a legitimidade da gravação
ambiental, recepcionando-a como elemento de prova contra a parte em processo cível e leitoral, apenas se verificado que a captação tenha sido efetuada em ambiente
público, externo ou de acesso ao público, em circunstância que não evidencie a quebra
da relação de intimidade e de privacidade entre os interlocutores.
Essa nova linha de pensamento foi inaugurada pelo Ministro Henrique
Neves da Silva, que, ao apreciar a aventada licitude da prova em investigação judicial
visando a apurar a ocorrência de captação ilícita de sufrágio, assim concluiu, em lapidar decisão:
"(..) No âmbito das lides eleitorais, a real motivação para a captação de imagens e
sons está diretamente relacionada com a produção de prova acusatória utilizada
em processos que visam à cassação de registros ou diplomas, emprestando-se
à conduta penal um caráter meramente coadjuvante.
Disto resulta que a garantia constitucional à privacidade não pode ser
afastada sem que haja necessária e prévia decisão judicial que autorize a
invasão de intimidade das pessoas gravadas.
Sobre o tema, reafirmo trecho do voto que proferi no julgamento do RO n. 1904-
61:
'É certo que não existem direitos absolutos e mesmo as regras de privacidade e
intimidade, inclusive a do lar, podem ser sobrepostas por outros interesses e
princípios igualmente protegidos pela Constituição Federal, especialmente, por
aqueles que visam à proteção do interesse público. Essa tensão de direitos
constitucionais, contudo, somente pode ser analisada, medida e decidida pelo
Poder Judiciário, que, diante dos elementos concretos coligidos, autorizará ou
não a medida excepcional de invasão. Sobre a interceptação ou gravação ambiental, tenho entendido que ela
constitui prova lícita apenas quanto presentes duas situações: autorização
judicial prévia e fundamentada ou gravação de segurança normalmente
utilizada de forma ostensiva e ambiente público, como ocorre, por
exemplo, nos bancos, centros e lojas comerciais, ou mesmo nas ruas'.
No mesmo sentido, reiterei tal entendimento no julgamento do REspe n. 541-78,
afirmando que a gravação ambiental pode ser lícita quando é feita em ambiente
em que normalmente há esse tipo de gravação, como em agência bancária, ou
em locais públicos, onde as pessoas sabem que podem ser filmadas.
Isso porque, para que se possa falar em violação à privacidade — garantia
prevista no art. 5°, X, da Constituição da República —, é essencial que a
intimidade da pessoa gravada seja efetivamente transgredida.
O conceito de privacidade é fluido, impreciso, não havendo definição
unívoca em sede doutrinária do seu alcance.
[...]
O certo é que, apesar da imprecisão dos seus limites, a privacidade
engloba todos aqueles fatos atinentes à personalidade que o indivíduo
opta por manter em esfera restrita e longe do alcance de qualquer pessoa.
Não é privado, contudo, o que, pelas circunstâncias ou por iniciativa do
indivíduo, é inserido ou ocorre em espaço público.
[...]
Diante disso, considerado o caráter público da reunião, apontado no acórdão
regional, devem ser afastadas as alegações postas no recurso especial de
ilicitude de gravações ambientais.
Isso porque, consoante apontado acima, a exigência de decisão judicial prévia
que autorize a captação de sons e imagens diz respeito à preservação da
intimidade nas conversas em que há direcionamento direto e expectativa de
privacidade entre os interlocutores, o que não se confunde com a situação em
que o candidato profere discurso para determinado grupo de pessoas, em
reunião pública, com a utilização ou não de equipamento de sonorização.
É que em tais espaços não há privacidade a ser preservada, porquanto a esfera
privada se refere apenas àqueles fatos que o indivíduo não deseja que sejam de
domínio público e cujo conhecimento é restrito a poucas pessoas, nas quais se
deposita alguma confiança.
Assim, se o próprio indivíduo vai a público e externa manifestação perante grupo
indistinto de pessoas, sem a necessária relação de confiança e sem expressar o caráter reservado da mensagem, não há segredo a ser preservado, não há
proteção contra a divulgação do conteúdo, não há, enfim, privacidade na
manifestação.
Dessa forma, caso alguém consiga filmar ou gravar a cena de um fato, uma
captação ilícita de sufrágio ocorrida em local aberto ao público ou sem
nenhum controle de acesso, o documento resultante da gravação de ser
considerado prova lícita.
[...]" [Respe n. 637-61, de 16.4.2015 - grifou-se].
Anotam-se, no mesmo sentido, os julgados: REspe n. 85-47, de
8.11.2016, Rei. Min. Herman Benjamin; REspe n. 640-36, de 1°7.2016, Rei. Min.
Gilmar Mendes.
Por fim, a corte considera como proscrita, ou inválida, a gravação
ambiental, quando verificado que a configuração do
ilícito somente se deu em decorrência da atuação direta do agente provocador,
mediante influência da livre vontade e consciência do candidato ou do eleitor, em
similitude ao flagrante preparado [Precedentes: REspe n. 95-29, de 7.6.2016, Rei. Min.
Luciana Lóssio; REspe n. 750-57, de 30.9.2015, Rei. Min. João Otávio de Noronha;
REspe n. 676-04, de 13.11.2014, Rei. Min. Henrique Neves da Silva].
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