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A inelegibilidade pela rejeição de contas


Da Inelegibilidade por rejeição das contas do administrador público (art. 1o, alínea “g”, da Lei Complementar n. 64/90) na Jurisprudência Eleitoral. A Nova Interpretação da Súmula n. 1 do TSE e o advento da nova redação dada pela lei da ficha limpa.

*Vinicius Cordeiro

                                1. Introdução


                                A inelegibilidade infraconstitucional decorrente da rejeição de contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas, principalmente pelos gestores chefes do Poder Executivo, em razão de irregularidade insanável ou por decisão irrecorrível do órgão competente, estabelecida pela Lei Complementar n. 64, de 1990 tem sido causa das mais freqüentes argüições pelos candidatos e pelo Ministério Público Eleitoral, sobretudo em eleições municipais; Há alguns anos, o Tribunal Superior Eleitoral, a espelho de outros, adotou o sistema de sumular decisões pacíficas, para servir de norte a toda Justiça Eleitoral Brasileira, visando uniformizar a jurisprudência e a correta aplicação, neste caso, da Lei das Inelegibilidades (Lei Complementar n. 64, de 1990).

                               Claro que o Tribunal Superior Eleitoral o fez com respaldo no Código Eleitoral (Art. 23, XV), estabelecendo seu entendimento acerca das inelegibilidades infraconstitucionais. Neste artigo queremos focar a (nova) interpretação dos Tribunais quanto à inelegibilidade posta no inciso I, alínea “g”, que determina sua incidência para os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se a questão houver sido ou estiver sendo submetida à apreciação do Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 5 (cinco) anos seguintes, contados a partir da data da decisão”.

                               Esse dispositivo teve uma interpretação durante mais de 15 anos, culminando pela edição da Súmula n. 1 do TSE – esta, sem ser revogada, ganhou uma releitura, durante o processo eleitoral de 2006, motivado sobretudo pelo fato do processo político ter ganho um cunho mais rígido dada a vontade de moralização por parte do Judiciário Eleitoral, para ser, posteriormente, expressamente cancelada, por meio da decisão constante do Acórdão do TSE de 10/5/2016, oriundo do PA n. 32345, publicado no DJE de 24, 27 e 28/6/2016.

E por fim, sobreveio a modificação da norma trazida pelo advento da nova Lei Complementar n. 135 de 2010, a chamada “lei da ficha limpa”, que assim dispôs:
:
Art. 1º São inelegíveis:
I – para qualquer cargo:
g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição;

                               O presente estudo visa analisar como a inelegibilidade em foco foi aplicada pela justiça Eleitoral, as críticas que emergiram da aplicabilidade desta norma, e sua evolução através da sua jurisprudência e mesmo pela doutrina, e passar a uma mais detida análise dessa nova versão da Súmula Eleitoral, em todos os seus multifacetados aspectos, e a incidência da Lei da Ficha Limpa, que a alterou.

                         

                                2. A Aplicabilidade da norma

                                2.1 Do sistema decisório

                                A decisão em questão expressamente prevista pelo legislador é do órgão administrativo, no caso o Tribunal de Contas da União, em nível federal, quanto aos Atos do Chefe do Poder Executivo, sob a forma de parecer prévio, ou da Administração Indireta, como também dos Convênios Federais celebrados com os Municípios. Ou ainda, o julgamento das contas dos Executivos Municipais pela Câmara Municipal, ou dos Governadores pelas Assembléias Legislativas, após o parecer prévio do Tribunal de Contas Estaduais; Atuam e decidem os mesmos Tribunais de Contas Estaduais, na Prestação de Contas dos Presidentes das Câmaras Municipais ou da Mesa da respectiva Assembléia Legislativa (Artigos 49, IX; 71, II; 75 e 31, da Constituição Federal).

                                Reitere-se, enfim, que no caso do julgamento de Convênios Estaduais ou Federais, os Tribunais de Contas proferem julgamento e não apenas o parecer prévio – de igual forma, o julgamento é terminativo quando da apreciação das Contas das Mesas das Casas Legislativas, ou dos gestores da Administração Indireta.

                                Analisando a questão, o Supremo Tribunal Federal assentou de forma mais clara, que o controle provem do Legislativo, e da vontade popular, sendo o parecer prévio meramente de caráter opinativo ao julgamento político-administrativo (REs 848.626 e 729.744).

                                Esse sistema não é estabelecido pela legislação infraconstitucional, mas pela própria Constituição Federal (Arts. 71; 75; 76, II e III). Esta estabelece a missão ancilar dos Tribunais de Contas, que elaboram “pareceres prévios”, posteriormente submetidos ao crivo do Poder Legislativo, como visto, em julgamento de caráter político-administrativo. Dessa decisão que se infere ou não a inelegibilidade e m comento.

                               O prazo prescricional de oito anos inicia-se a contar da decisão, seja a de natureza administrativa ou judicial. Caso se interponha a ação desconstitutiva ou anulatória, o prazo prescricional somente começará a ser contado a partir do momento em que a suspensão da inelegibilidade cessar (antes, somente com o trânsito em julgado, agora pelo término do efeito suspensivo de uma liminar ou da eventual reforma da tutela antecipada).


TCE recomenda rejeição das contas da Prefeitura Municipal de ...



                               2.2 Da insanabilidade das contas 

                               No novo texto trazido à norma pela lei da ficha limpa, que ampliou o lapso temporal, a alínea “g”, entre as 14 hipóteses previstas taxativamente em lei, a norma, uma das que mais se concretizam na prática, na judicialização de sua incidência, exige que os atos que originaram a rejeição das contas efetivamente causem lesão ao erário, ou praticados na modalidade culposa, para que se configurem como causadores de inelegibilidade. São atos que importem em enriquecimento ilícito, lesão ao erário, ou que atentem contra os princípios da administração pública, observando-se a existência do dolo em praticar a ilegalidade ou conduta de improbidade em questão.

Na esteira do antigo entendimento, a rejeição das contas já deveriam ser fundamentadas pelo fato das mesmas conter nota de improbidade e/ou vícios considerados insanáveis (TSE, RESPE n. 12989/RN, rel. Min. Eduardo Alckmin, DJU 26/11/1996; RESPE Nº: 22704 - CE, AC. Nº 22704, DE 19/10/2004, Rel.: LUIZ CARLOS LOPES MADEIRA; RESPE Nº: 24448 (ARESPE) - MG, AC. Nº 24448, DE 07/10/2004, Rel.: CARLOS MÁRIO DA SILVA VELLOSO.

Agora, segue o seguinte entendimento o Colendo TSE:

“Eleições 2012. Recurso especial. Registro de candidatura. Art. 29-A da Constituição Federal. Deferimento. Vereador. Dolo. Ausência. Inelegibilidade. Art. 1º, I, g, da LC nº 64/90. Não configuração. Desprovimento. 1. O dolo é elemento indispensável para a configuração da inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90, e não se confunde com a mera imperícia do administrador. 2. In casu, não há elementos que indiquem dolo, má-fé, enriquecimento ilícito ou lesão ao erário, não podendo se falar em inelegibilidade decorrente da rejeição de contas públicas. 3. Em caso de dúvida sobre o exigido dolo na conduta do candidato, deve prevalecer o direito fundamental à elegibilidade capacidade eleitoral passiva. Precedente. 4. Recurso especial a que se nega provimento.” (TSE, Respe n. 11578, rel. Min. Luciana Lossio, de 24/6/2014).
E ainda:
[...] Agravo regimental. Recurso especial provido. Eleições 2012. Registro de candidatura. Vereadora. Deferimento. Rejeição de contas públicas. LC nº 64/90, art. 1º, i, g. Não incidência. Recurso de revisão. Aprovação das contas com Ressalva. Desprovimento. 1. A única irregularidade apontada no caso concreto - ausência de data de recebimento, por parte das empresas convidadas, no protocolo de entrega da carta-convite - não constitui falha suficiente para atrair a hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90. [...] 3. As inelegibilidades devem ser interpretadas de forma restritiva. [...]"

“Rejeição de contas - alínea g do artigo 1º da lei complementar nº 64/1990 - ato doloso de improbidade - inobservância da lei de responsabilidade fiscal e da Constituição Federal. Em se tratando de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Constituição Federal, esta última quanto à aplicação, no ensino, de valor abaixo do piso fixado, o ato surge como de improbidade, sendo ínsito o elemento subjetivo - o dolo.”

“Inelegibilidade - Tribunal de Contas - Decisão - Exame. Cumpre à Justiça Eleitoral, ante pronunciamento do Tribunal de Contas, verificar a configuração, ou não, da inelegibilidade prevista no artigo 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/1990. [...] Inelegibilidade - Rejeição de contas - Imposição de multa. O simples fato de o administrador satisfazer a multa imposta pelo Tribunal de Contas não afasta a inelegibilidade prevista no artigo 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/1990.”


                                Inexistindo nos autos suporte probatório suficiente ou mesmo indicação de dados que impliquem em improbidade imputável ao agente público, descabe a alegação de inelegibilidade; existindo os elementos, pode a Justiça Eleitoral aferir, nos processos de registro de candidatura, os motivos que ensejaram a rejeição das contas, verificando se as irregularidades têm ou não natureza insanável (STF, MS n. 22087-2/DF, rel. Min. Carlos Velloso, DJU 10/05/1996; TSE, RO ns. 143/RO, 137/RO, 148/RO, 107/RO, todos de 1998; RESPE n. 12.872/MT, de 11/09/1996, rel. Min. Ilmar Galvão; RO n. 577, 03/09/2002, rel. Min. Fernando Neves; ARO n. 640/TO, de 20/09/2002, rel. Min. Luiz Carlos Lopes Madeira; RESPE n. 16433, de 16/09/2000, rel. Min. Fernando Neves da Silva; RESPE n. 20437, de 25/09/2002, rel. Min. Sepúlveda Pertence; RO n. 1010, de 21/11/2006, rel. Min. Antonio César Peluso; RO n. 1178, em 16/11/2006, rel. Min. Antonio César Peluso). Segundo JOEL JOSE CANDIDO (1) “(..) irregularidade insanável é aquela que, cometida, definitivamente não pode ser mais corrigida. Ela é insuprível e acarreta uma situação de irreversibilidade na administração pública e de seus interesses, além de se caracterizar como improbidade administrativa (..) nem sempre a irregularidade insanável é criminosa, nos moldes da tipicidade penal, eleitoral ou comum. Pode ocorrer, porém, que o comportamento do agente se caracterize como irregularidade insanável nos termos desta alínea g e seja, também, crime, o que acarretará dupla responsabilidade. Sempre, porém, a irregularidade insanável corresponderá aos atos de improbidade administrativa, estes tais como definidos na Lei n. 8.429/92 (arts. 9o, caput, 10, caput, e 11, caput)”.

A possibilidade e competência do exame da insanibilidade pela Justiça Eleitoral segue intacta, como veremos de decisão mais recente do TSE, senão vejamos:

“[...] Registro de candidatura. Vereador. Rejeição de contas. Presidente da Câmara Municipal. Contratação de contador sem concurso público. Tribunal de contas. Indicação de falha formal. Ausência de vício insanável. 1. A indicação no acórdão do Tribunal de Contas de falha de natureza formal revela que a irregularidade constatada não se enquadra na inelegibilidade da alínea g do inciso I do art. 1º da LC nº 64/90. 2. A circunstância de serem considerados os termos da decisão do Tribunal de Contas, para fins da incidência da inelegibilidade da alínea g, não implica alteração da jurisprudência no sentido de que a natureza das irregularidades pode ser aferida pela Justiça Eleitoral, ainda que não tenha sido apontada, na decisão que rejeitou as contas, a ocorrência de ato doloso de improbidade administrativa. 3. Entretanto, a fundamentação adotada pela Corte de Contas, órgão competente que detém o conhecimento técnico para o julgamento das contas, é de fundamental importância para subsidiar as decisões da Justiça Eleitoral no que tange à inelegibilidade da mencionada alínea g. 4. Recurso provido para deferir o registro do candidato.”


                                Evidenciam a insanabilidade, por exemplo, a fraude em licitações (TSE, RO n. 1311/GO, de 31/10/2006, rel. Min. Caputo Bastos),  dispensa indevida de licitações, superfaturamento de preços  (RO n. 1265/MA, de 26/10/2006, rel. Carlos Ayres de Brito) ou outros atos de dano ao Erário decorrente de ato de gestão ilegítimo e antieconômico que podem - em tese - configurar improbidade administrativa. Da melhor jurisprudência do TSE:
                                       Eleições 2004. Recurso Especial. Registro. Impugnação. Rejeição de contas (art. 1º, I, g, da LC nº 64/90). Caso em que a Corte de Contas não incluiu o nome do responsável na lista de inelegíveis (art. 11, § 5º, da Lei nº 9.504/97).  Irregularidades sanáveis. Deferimento do registro.
A irregularidade insanável não supõe necessariamente ato de improbidade ou a irreparabilidade material.
A insanabilidade pressupõe a prática de ato de má-fé, por motivação subalterna, contrária ao interesse público, marcado pela ocasião ou pela vantagem, pelo proveito ou benefício pessoal, mesmo que imaterial” (RESPE n. 23565/PR, em 21/10/2004, relator Min. Luiz Carlos Madeira)
                                Desta forma, meros erros formais ou contábeis não ensejam a inelegibilidade prevista (TSE, RESPE n. 14503, de 25.2.97, rel. Ilmar Galvão); um dos mais comuns, interessantes em se destacar pela sua comum incidência, é o da possibilidade da não-aplicação, pelo prefeito, dos recursos mínimos exigidos constitucionalmente para a educação, manutenção e desenvolvimento do ensino. Essa irregularidade não acarretava inelegibilidade, não se constituindo em improbidade ou ato de abuso do poder público, escorando-se em vasto repertório jurisprudencial e doutrinário a respeito, posteriormente revisto, em sede eleitoral, inicialmente:  

“(..) A rejeição legislativa de contas públicas, com fundamento na ausência de aplicação do percentual compulsório mínimo determinado pelo texto constitucional em favor do ensino fundamental, não conduz, por si só, ao reconhecimento de uma situação caracterizadora de improbidade administrativa (LC n. 64/90, art. 1o, Inc. I, letra g). (STF, RE n. 160.472-8, 1a turma, rel. Celso Mello)

“(..) Não-aplicação do mínimo constitucional da receita de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino - Irregularidade que não acarreta inelegibilidade.” (TSE, RESPE n. 16433, em 05/09/2000, Cananéia-SP, rel. Min. Fernando Neves da Silva)

Depois, o TSE assim assentou:

“Rejeição de contas - alínea g do artigo 1º da lei complementar nº 64/1990 - ato doloso de improbidade - inobservância da lei de responsabilidade fiscal e da Constituição Federal. Em se tratando de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Constituição Federal, esta última quanto à aplicação, no ensino, de valor abaixo do piso fixado, o ato surge como de improbidade, sendo ínsito o elemento subjetivo - o dolo.”

Outros precedentes dignos de nota, no mesmo sentido, da lavra da Corte Maior Eleitoral são: RESPE Nº: 10266 - SP; RESPE Nº: 13203 - SE, de 27/11/1996, Rel. Min. FRANCISCO REZEK, Ac. n. 10.138, de 17.9.92; RESPE n. 12.571, de 18.9.92, rel. Min. Torquato Jardim.  Ressalve-se também o interessante julgado pelo qual suposta conduta antiecológica por parte de Prefeito Municipal também nesta insuscetível de ser considerada irregularidade contemplada na letra g do inc. I do art. 1o da LC 64 (TSE, Ac. n. 11.146, de 15/08/1990, rel. Min. Octávio Gallotti).
De igual forma, considerou-se irregularidade insanável a não observância dos tetos constitucionais, nos gastos dos vereadores:
“Eleições 2016. Agravo regimental no recurso especial eleitoral. Registro de candidatura. Indeferimento. Cargo de vereador. Rejeição de contas. Despesas em valor superior ao limite fixado no art. 29-A, i, da CRFB/88. Excesso de 0,84%. Dolo presumido. Incidência da inelegibilidade prevista no art. 1º, i, g, da Lei Complementar nº 64/90. Decisão mantida. Desprovimento.  1. O art. 1º, inciso I, alínea g, do Estatuto das Inelegibilidades reclama, para a sua caracterização, o preenchimento, cumulativo, dos seguintes pressupostos fático-jurídicos: (i) o exercício de cargos ou funções públicas; (ii) a rejeição das contas pelo órgão competente; (iii) a insanabilidade da irregularidade apurada, (iv) o ato doloso de improbidade administrativa; (v) a irrecorribilidade do pronunciamento que desaprovara; e (vi) a inexistência de suspensão ou anulação judicial do aresto que rejeitara as contas;  2. O ultraje aos limites do art. 29-A da Lei Fundamental de 1988 qualifica-se juridicamente, para fins de exame do estado jurídico de elegibilidade, como (i) vício insanável e (ii) ato doloso de improbidade administrativa, independentemente do percentual que exorbita o teto de gastos constitucional [...] 3. O dolo da conduta do Presidente da Câmara Municipal que procede à realização de despesas exorbitando os tetos constitucionais do art. 29-A é presumido, circunstância que afasta, para sua caracterização, qualquer análise a respeito do aspecto volitivo do agente que praticou o ato irregular.   4. In casu,  a) o Recorrente teve suas contas, relativas ao exercício de 2011, rejeitadas pelo Tribunal de Contas, nos termos do Acórdão n° TC-002549/026/11, com trânsito em julgado em 12.12.2014 (fls. 217). As irregularidades materializaram-se com a realização de despesas em montante correspondente a 7,84% do somatório da receita tributária e transferências, efetivamente realizadas no exercício anterior, em desacordo com o art. 29-A, inciso I, da Constituição de 1988, incluído pela Emenda Constitucional n° 25, de 2000;  b) ao apreciar a quaestio, o TRE/SP, debruçando-se sobre o acervo fático-probatório, concluiu que a irregularidade apurada pela Corte de Contas (i.e. realização de despesas a maior, em flagrante desacordo com o art. 29-A, I, da CRFB/88) consubstancia vício insanável, apta, desse modo, a atrair a causa de inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1° da LC nº 64/90;  c) a fixação de limites constitucionais para gastos em âmbito municipal, levada a efeito pelo constituinte reformador em sucessivas reformas (ECs nº 25/2000 e nº 58/2009), ancorou-se na necessidade premente de implantar uma política de responsabilidade fiscal nessas entidades, de forma a reduzir, sobremaneira, a discricionariedade do gestor (no caso, Presidente da Câmara Municipal) na realização de despesas do Poder Legislativo que, não raro, comprometiam a saúde financeira da municipalidade, em razão do investimento em áreas pouco prioritárias, e, por consequência, devastavam as contas públicas locais; d) aludido arranjo institucional evita, ou, ao menos, amaina, a promiscuidade oneômana das Câmaras Municipais com gastos dessa natureza, a qual, à evidência, subtraía recursos essenciais à manutenção dos serviços públicos básicos da edilidade. e) a aplicação das máximas da proporcionalidade e da razoabilidade para aferir a existência in concrecto de dolo na transgressão aos arts. 29, VI, e 29-A da Constituição, instituiria um critério excessivamente subjetivo e casuístico de análise dessas condutas, de sorte a estimular o gestor a proceder a gastos em patamares sempre próximos (a maior ou a menor) dos limites estabelecidos, testando diuturnamente a tolerância decisória do Tribunal com tais violações; f) a fixação de standard objetivo no exame de ofensas aos tetos dos arts. 29, VI, e 29-A (i.e., a simples contrariedade já configurar vício insanável e doloso de improbidade) empresta segurança jurídica, previsibilidade e isonomia a todos os gestores no âmbito do Legislativo local, os quais terão plena ciência ex ante acerca das condutas permitidas ou proscritas; g) os Presidentes de Câmaras Municipais deverão ser mais cautelosos e prudentes no controle dos gastos orçamentários, porque o ultraje aos limites constitucionais, em qualquer percentual, ensejará irregularidade de natureza insanável caracterizada como dolosa para fins de inelegibilidade. É a própria efetividade das normas constitucionais que estão em jogo: ou bem referidas disposições são dotadas de imperatividade, força cogente, e, portanto, de cumprimento compulsório, ou bem se apresentam como recomendações sem qualquer força vinculante a seus destinatários; h) ademais, parâmetros objetivos repudiam eventuais voluntarismos decisórios, materializados em juízos de proporcionalidade e de razoabilidade desprovidos de qualquer desenvolvimento analítico e metodológico, recaindo, bem por isso, em achismos travestidos de fundamentação jurídica. A consequência inescapável é desastrosa, por ocasionar mais insegurança e injustiças aos envolvidos, e, no limite, por comprometer a própria credibilidade da Justiça Eleitoral, que terá decisões conflitantes em situações bastante assemelhadas; i) no âmbito eleitoral, em especial nas impugnações de registro por alínea g, prestigiar essa política de maior responsabilidade fiscal reclama uma postura fiscalizatória mais criteriosa por parte da Justiça Eleitoral, sempre que se verificar a inobservância dos limites encartados nos arts. 29, VI, e 29-A, razão pela qual é defeso transigir com comportamentos desidiosos e irresponsáveis praticados pelos Presidentes de Câmaras Municipais, que, sabidamente, tinham plena consciência das restrições orçamentárias previamente estabelecidas e, ainda assim, ultrapassaram os limites impostos pela Lei Maior. Advogar tese oposta equivale a abrir uma fresta perigosa e deletéria para a realização de despesas para além do que autoriza a Constituição; j) como consectário, a desaprovação das contas, alusivas ao exercício de 2011 (TC-002549/026/11), ante a realização de despesas em montante superior ao previsto no art. 29-A, consubstancia vício insanável configurador de ato doloso de improbidade administrativa [...] ”.

Vejam mais este caso, de lavra do TSE:

“Eleições 2016. Vereador. Recurso especial. Impugnação ao registro de candidatura. Inelegibilidade. Art. 1º, I, g, da LC nº 64/90. Registro indeferido. Presidente da câmara municipal. Contas rejeitadas. Tribunal de contas do estado. Contratação de escritório contábil. Valor do serviço contratado superior ao limite legal para autorizar a dispensa da licitação. Ausência do devido processo administrativo formal. Ato doloso de improbidade administrativa caracterizado. [...] 4. No que toca ao elemento subjetivo, exigido para a devida incidência da norma restritiva a elegibilidade, prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90, basta para sua configuração a existência do dolo genérico ou eventual, o que se caracteriza quando o administrador deixa de observar os comandos constitucionais, legais ou contratuais que vinculam sua atuação. Precedentes. [...]”.
                                No questionamento da inelegibilidade em tela, seja o motivo qual for, sempre caberá ao impugnante o ônus de comprovar a irregularidade insuprível (TSE, RESPE n. 11.145, de 15/08/90, rel. Min. Villas-Boas), sobretudo na ausência de suporte comprobatório (RESPE n. 11.381, de 01/09/1990, rel. Min. Célio Borja).
                                 Ainda, da melhor jurisprudência colacionada sobre a matéria:

                                “(..) O TC julga as contas de convênios. Mas mesmo assim a decisão do TC, embora tenha aplicado multa ao ordenador de despesa não expondo os motivos da rejeição, não há como afirmar tenha havido vícios insanáveis a ensejar o decreto de inelegibilidade previsto na LC 64/90” (TSE, RESPE n. 16.607, de 12/09/2000, rel. Min. Garcia Vieira).

                                “Recurso especial. Registro. Rejeição de contas. Membro da Câmara Municipal. Remuneração paga a maior e abono de faltas. Inexistência de insanabilidade. Recurso não conhecido.” (TSE, RESPE n. 16.937/PE, de 05/10/2000, rel. Min. Costa Porto)

                                Inelegibilidade. 2. Lei Complementar n. 64, Art. 1, I, Letra “G”. 3. Hipótese em que as contas do candidato, ex-presidente da Câmara Municipal foram consideradas irregulares pelo Tribunal de contas dos Municípios, sem a nota de irregularidades insanáveis, nem refeRência a improbidade ou a prática de atos dolosos ou mediante fraude. 4. irregularidades remanescentes tidas como “falhas” e, em relação as quais, o Tribunal de contas dos municípios fez “recomendações” a Câmara Municipal, com vistas a não-repetição. 5. Caso concreto em que não ocorre a inelegibilidade do art. 1, I, letra “G” da Lei Complementar n. 64/90. 6. Recurso conhecido como ordinário, negando-se-lhe provimento.”  (TSE, RESPE n. 15381/CE, de 27/08/1998, rel. Min. Néri da Silveira)

                                “A rejeição das contas não implica, por si só, improbidade administrativa, sendo necessária decisão judicial que assente responsabilidade por danos ao erário (..)” (TSE, AG n. 3009/PI, de 09/10/2001, rel. Min. Fernando Neves da Silva)

                                “É assente, na jurisprudência, que irregularidade insanável é aquela que indica ato de improbidade administrativa ou qualquer forma de desvio de valores.” (do RESPE n. 21896, em 26/08/2004, rel. Min. Peçanha Martins, RESPE n. 21796 , mesma data e relator).

                                Mais recente, já sob o condão da nova interpretação da Súmula n. 1, do TSE:
                               “RECURSO ORDINÁRIO. DEFERIMENTO. REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO ESTADUAL. REJEIÇÃO DE CONTAS. TCU. CONVÊNIO ENTRE MUNICÍPIO E UNIÃO. CARÁTER INSANÁVEL. PROPOSITURA DE AÇÃO NA JUSTIÇA COMUM. AUSÊNCIA DE LIMINAR OU ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. NÃO-APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 1/TSE. PROVIMENTO.
1. O TSE deve analisar a idoneidade da ação desconstitutiva ajuizada pelo candidato. Tal juízo é complementar ao permissivo posto na Súmula nº 1/TSE.
2. Não basta que o candidato ajuíze, na Justiça Comum, a ação desconstitutiva. Deve-se perquirir, na esfera eleitoral, se a pretensão formulada é idônea a afastar a rejeição de contas. Precedente: RO nº 931, Rel. Ministro César Asfor Rocha, sessão de 29.8.2006.
3. A ação anulatória manejada não é apta a combater o acórdão do TCU, referente ao descumprimento de convênio celebrado entre o município de Estância/SE e a União, por intermédio do Ministério do Meio Ambiente, para a construção de muro de contenção de marés no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais). A obra não foi levada a termo, sendo de responsabilidade do gestor municipal, ora recorrido, a sua consecução. Tais circunstâncias demonstram o caráter insanável da rejeição de contas, que pode ser aferido pela Justiça Eleitoral (RO nº 681, Rel. Min. Fernando Neves, DJ de 17.10.2003).
4. Ato de vontade do recorrido de natureza processual que não se sobrepõe aos objetivos de aplicação do princípio da moralidade pública ínsito na legislação específica.
5. Não há, outrossim, pedido deferido de tutela antecipada ou liminar, que possa traduzir a plausibilidade da pretensão formulada na justiça comum.
6. Recurso ordinário provido.”(TSE, RO n. 1065/SE, de 21/09/2006, relator Ministro José Delgado)

                                O reembolso obrigatório, na ausência, ou rejeição na prestação de contas de convênio, na condenação administrativa ou judicial, ou ainda, no caso de se quitar multa administrativa determinada pelo Tribunal de Contas, não afastarão a causa de inelegibilidade prevista na alínea “g”, do Art. 1o, da Lei das Inelegibilidades (TSE, RESPE n. 12.976/SE – Rel. Min. Ilmar Galvão, DJU 12/11/96) - isso decorre de uma “natureza moral” da norma (2), - ou melhor, a inelegibilidade tem per si, uma natureza moral, no apropriado comento de Joel José Candido (3).

Lembrando que deliberação de Câmara Municipal sobre convênios federais, no ensejo de rejeição de contas é inócua, cabendo ao TCU esta competência, senão vejamos:

“Registro. Inelegibilidade. Rejeição de contas. Art. 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/90. Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério). Verba estadual. Órgão competente. 1. Para a configuração da inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90, é necessário que haja decisão irrecorrível do órgão competente. 2. No caso, o acórdão regional e a decisão agravada apontaram que a Câmara de Vereadores não era assim como efetivamente não é o órgão competente para apreciar as contas relativas ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) e que a destinação do recurso do referido fundo não foi considerada irregular pelo órgão competente. 3. Na linha da jurisprudência desta Corte: Diante da aplicação irregular de receitas repassadas ao município por meio de convênio sem a participação da União, a competência para julgar as contas é do Tribunal de Contas Estadual, e não do Tribunal de Contas da União ou da Câmara de Vereadores [...] 4. Não caracterizada a inelegibilidade, resta prejudicado o fundamento relativo à contagem do seu prazo. Agravo regimental a que se nega provimento.”

                               E não importa qual foi a via judicial ou administrativa ou órgão perquirido para atestar ou configurar os atos ilegais ou ímprobos, para o TSE:

“Agravo regimental. Recurso especial. Recurso contra expedição de diploma. Inelegibilidade. Rejeição de contas públicas. [...] 2. Na linha da jurisprudência desta Corte Superior, para a incidência da alínea g do inciso I do art. 1º da Lei Complementar nº 64/90, é irrelevante a natureza do procedimento por meio do qual as irregularidades foram apuradas, bastando que o órgão competente tenha reconhecido se tratar de vício insanável que configure, em tese, ato doloso de improbidade administrativa, mediante decisão irrecorrível que não tenha sido suspensa por decisão judicial. 3. Afastado o fundamento do acórdão do Tribunal Regional Eleitoral ausência de decisão do órgão competente no processo cabível , deve ser determinado o retorno dos autos àquela instância para a análise dos demais requisitos exigidos para a caracterização da inelegibilidade. [...]”

                      Afinal, o sistema engendrado foi o dos chefes do Poder Executivo agregarem a prestação de contas anuais da Administração Direta e Indireta, submetendo-se ao crivo dos representantes do povo, no Poder Legislativo. O modelo federal é reproduzido obrigatoriamente em todos os entes federados, Estados e Municípios. As Cortes de Contas vão apurar esses relatórios anuais contábeis, financeiros, e confronta-los com a devida adequação dessas prestações de contas à legislação adjetiva (como a das licitações, p. ex.), ao orçamento, com mais propriedade, e dotados de instrumental técnico mais adequado, para a confecção de pareceres prévios orientativos da decisão legislativa ou terminativamente, no caso das contas das Mesas do mesmo Poder Legislativo; Torna-se evidente que para a ocorrência da inelegibilidade em foco, necessita-se do pronunciamento obrigatório da Câmara Municipal (STF, RE n. 132747; TSE, RESPE ns. 12574, de 18/09/1992, rel. Min. Sepúlveda Pertence; Acórdãos ns. 12645, 12694, 13174, 13..367/PE e 12936/TO), de caráter imprescindível, não bastando apenas o parecer prévio do Tribunal de Contas. Da decisão do Supremo Tribunal Federal:
”RECURSO EXTRAORDINÁRIO - ACÓRDÃO DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL - FUNDAMENTO LEGAL E CONSTITUCIONAL. O fato de o provimento atacado mediante o extraordinário estar alicerçado em fundamentos estritamente legais e constitucionais não prejudica a apreciação do extraordinário. No campo interpretativo cumpre adotar posição que preserve a atividade precípua do Supremo Tribunal Federal - de guardião da Carta Política da Republica. INELEGIBILIDADE - PREFEITO - REJEIÇÃO DE CONTAS - COMPETÊNCIA. Ao Poder Legislativo compete o julgamento das contas do Chefe do Executivo, considerados os três níveis - federal, estadual e municipal. O Tribunal de Contas exsurge como simples órgão auxiliar, atuando na esfera opinativa - inteligência dos artigos 11 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, 25, 31, 49, inciso IX, 71 e 75, todos do corpo permanente da Carta de 1988.” (do RE 132747/DF, relator Min. Marco Aurélio, j. em 17/06/1992, pleno, v.u., publ. DJU 07/12/1995).
                                 Fala-se em “dualidade” de funções do TCU, ou mesmo um controle de contas “misto”, gerando críticas como a de Edson de Resende Castro (4), que não acha justo os Tribunais de Contas serem considerados simples órgãos administrativos de caráter meramente auxiliar, dado o status constitucional e a autonomia a si reservada. É o efeito “mais que opinativo” das decisões dos Tribunais de Contas já aludido num Acórdão do TSE pelo Ministro Pedro Acioli (RESPE n. 11377, de 01/09/1990).

                                Outra interessante e controversa questão versa sobre a hipótese de uma segunda deliberação do Legislativo que eventualmente, aprove as contas do Executivo, após tê-las rejeitado; Para o ex-ministro e comentarista Torquato Jardim é possível a suspensão por tal ato;  já para o TSE, a retratação sem fundamentação não tira a validade da suspensão da inelegibilidade (TSE, RESPE n. 12.112, de 09/08/1994, rel. Min. Carlos Mario Velloso)

                                O Poder Judiciário não pode rever as decisões técnicas do Tribunal de Contas, mas pode se ater à análise da legalidade dos aspectos formais, procedimentais do ato administrativo, não podendo se imiscuir em matéria interna corporis do Legislativo, como o de questionar a motivação da rejeição das contas, já que, como já dito, a natureza do julgamento das Contas pelo Legislativo é político-administrativa; pode o Judiciário analisar matéria procedimental, tal como a observância das normas legais, regimentais e mesmo Constitucionais que eventualmente forem descumpridas, sendo o mais comum se invocar a falta de observância do amplo direito de defesa, do quorum qualificado para tal, prazos, etc. (TJMG, Ap. Cível n. 96.808-1/00, Pará de Minas, Rel. Isaltino Lisboa, 26/10/2000; Ap. Cível n. 252.500-4/00, BH, relator Desemb. Brandão Teixeira, em 18/3/2003) – cumpre esclarecer que o exame do processo de votação e de edição dos Decretos Legislativos que aprovam ou não as contas do Executivo, são da competência da Justiça Comum, e não da Eleitoral (TSE, RESPEs  ns. 12.844, 12.839).

                                Afinal, a inelegibilidade da alínea “g” como de qualquer alínea elencada no art. 1o da LC n. 64/90 está sujeita à preclusão, somente podendo ser argüida durante o processo do registro de candidaturas, não se sujeitando ao que estabelece expressamente o Art. 223 do Código Eleitoral. E o prazo somente incide a partir da irrecorribilidade da decisão de rejeição de contas pelo órgão competente (TSE, AgR-Respe n. 4255, de 7/2/201, rel. Min. Henrique Neves).

Veja-se que a norma fala em “função pública”, compreendendo tanto gestores como agentes públicos (TSE, EDcl. n. 611, de 12/9/2002, rel. Min. Fernando Neves).

Jurisprudência aplicável do TSE:

“[...] Inelegibilidade. Art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90. Ausência do inteiro teor da decisão de rejeição de contas. Impossibilidade de aferir a natureza das irregularidades e individualizar as condutas dos responsáveis. Não provimento. [...] 2. O reconhecimento da inelegibilidade, na hipótese de contas prestadas por mais de um gestor público no exercício analisado pelo órgão competente, pressupõe a individualização das respectivas condutas. Precedente. [...]”


                        3. A construção da Súmula n. 1 do TSE

                                Para o Judiciário Eleitoral, bastava que o Administrador ajuizasse a competente ação desconstitutiva da decisão do Legislativo ou da corte de contas para que evitasse a inelegibilidade prevista por 05 anos, até o seu trânsito julgado. As decisões foram se sucedendo e reiterando-se: os Recursos Especiais nos 9.816, 10.136, 10.626 e 10.503. 
 “INELEGIBILIDADE (LC N. 64/90, ART. 1, I, "G"): EFICACIA SUSPENSIVA DA PROPOSITURA, ANTES DA IMPUGNACAO, DE ACAO DE NULIDADE DA REJEICAO DAS CONTAS, NADA IMPORTANDO QUE SE FUNDE A DEMANDA EM VÍCIOS PROCESSUAIS OU DE MERITO DE DELIBERACAO QUESTIONADA (V.G., TSE, RECURSOS NS. 10.803, 10.118 E 10.121).” (TSE, RESPE n. 10503/SP, Ac. 12675, j. em 21/09/1992, relator Min. Sepúlveda Pertence)
“RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATO. REJEICAO DE CONTAS. INELEGIBILIDADE. CONTAS REJEITADAS E SUBMETIDAS A APRECIACAO DO PODER JUDICIARIO COMUM, ANTES DA ACAO DE IMPUGNACAO DO REGISTRO, SUSPENDE A CAUSA DA INELEGIBILIDADE (SÚMULA 1/TSE). RECURSO NAO CONHECIDO.” (TSE, RESPE n. 9816/PI, Ac. 12555, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 17/09/1992)
           
“RECURSO ESPECIAL CONTRA DECISÃO DO TRE/SP. INDEFERIMENTO DE REGISTRO. CANDIDATO A PREFEITO. INELEGIBILIDADE.
REJEIÇÃO DE CONTAS SUBMETIDA A APRECIACAO DO PODER JUDICIARIO COMPETENTE, AFASTA A CAUSA DE INELEGIBILIDADE.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.”(TSE, RESPE n. 10136, Ac. 12557/SP; relator Américo Luz, j. em 17/09/1992)
                                Sendo assim, logo a primeira série de decisões a ser sumulada, por reiteradas aplicações, e entendimento pacífico e uníssono foi no sentido de que a inelegibilidade contida no inciso I, alínea “g”, do art. 1o da citada Lei era suspensa com o simples ajuizamento da competente ação desconstitutiva, desde que proposta antes do pedido de registro de candidatura. A Súmula n. 1 da Colenda Corte Eleitoral, de 21 de setembro de 1992, preconizava: “Proposta a ação para desconstituir a decisão que rejeitou as contas, anteriormente à impugnação, fica suspensa a inelegibilidade (Lei Complementar no 64/90, art. 1o, I, g)”.

                                Também por exegese legal foi estabelecido que deveria essa ação atacar todos os fundamentos da rejeição – não apenas alguns (TSE, RESPE n. 12.595, de 19/09/1992, rel. Min. Américo Luz; RESPE n. 13.206, de 15/12/1992, rel. Min. Flaquer Scartezzini; RESPE n. 13.883/SP, rel. Min. Francisco Rezek, DJU 26/11/1996), podendo ser tanto contra a decisão do Tribunal de Contas, ou da decisão da Câmara Municipal.

A doutrina e a jurisprudência foram uníssonas e inequívocas quanto ao alcance da norma em comento, quanto de sua exegese legal. Para Joel José Cândido, essa ação devia ser contenciosa, de procedimento ordinário e de conhecimento pleno, a fim de declarar insubsistente, rescindir ou invalidar a decisão administrativa definitiva que rejeitou as contas. Esse regramento foi o observado em todos os processos eleitorais na década de 90, e também nas eleições mais recentes, de 2000, 2002 e 2004.

Porém, em 2006, o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, em sua nova e controvertida composição, adotou nova posição, revogando o estabelecido na Súmula n. 1 do Colendo TSE. Outrossim, manteve-se o aferimento das condições da elegilibilidade e inelegibilidade, no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, alcançando a inelegilidade agora até os oito anos seguintes da decisão irrecorrível que rejeitou as contas, de acordo com a nova redação dada pela LC 135/2010, como se infere:

Do Colendo TSE:

                               “Eleições 2014. Recurso ordinário. Registro de candidatura deferido. Deputado estadual. Art. 1°, I, g, da LC n° 64/90. Incidência afastada. Exaurimento. Prazo de inelegibilidade. Provimento. 1.  Conforme dispõe o art. 1°, I, g, da LC n° 64/90, a inelegibilidade alcança as eleições que se realizarem nos oito anos seguintes, contados a partir da data da decisão irrecorrível que rejeitou as contas. 2.  Segundo preceitua o art. 11, § 10, da Lei n° 9.504/97, as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, ressalvadas as alterações, fáticas ou jurídicas, supervenientes ao registro, advindas até a data da eleição [...] 3.  No caso vertente, o fato superveniente que afasta a inelegibilidade é o esgotamento do prazo de oito anos da inelegibilidade, que se findou no dia 6.9.2014. 4.  Recurso ordinário ao qual se nega provimento.”



                               4. Críticas à antiga orientação jurisprudencial

                               Apesar da estabilidade na aplicação da regra em comento, não eram poucas as críticas do que certamente foi um instituto do possível, ante à elaboração pouco claro por parte do legislador pós-constitucional. De fato, os maus administradores se valeram inúmeras vezes da brecha legal, digamos assim, para driblar, com certa facilidade até, a real vontade do legislador que era a de punir os maus administradores e afastá-los da disputa eleitoral. Apesar da boa intenção, a mensagem que ficou era da esperteza, e mesmo da impunidade.

Alertavam Alberto Rollo e Enir Braga:

“(..) o prazo vai se esvaindo, ficando impune o administrador ímprobo enquanto perdurar a demora do aparelho judiciário em examinar o pedido invocado. Aqui está uma situação inteiramente lamentável, em que a conhecida dificuldade da Justiça Comum e m julgar rapidamente vem a beneficiar o administrador cometedor de atos de improbidade. (..)”

O advogado Valmor Giavarina, no seu conhecido Manual Eleitoral criticava abertamente tal situação:

“(..) Mas a prática nos mostra que o tiro saiu pela culatra, não obstante o saber jurídico dos ministros que compunham a corte na época em que a súmula foi elaborada: dezenas de Prefeitos nem tomam conhecimento da posição do Tribunal de Contas e muito menos da Câmara de Vereadores. Fazem o que bem entendem, ao arrepio da lei, têm suas contas rejeitadas mas dormem tranqüilos porque sabem que nas vésperas do registro de outra candidatura qualquer, ingressam em juízo com uma ação desconstitutiva, protestando pela apresentação de todas as provas admitidas em direito, e pronto. Estará afastada sua inelegibilidade com amparo da própria justiça, ou seja, da súmula n. 1, que à toda evidência, precisa ser revogada” .

                                No mesmo sentido, o ex-presidente do TSE, Ministro Paulo Brossard (10) assim se expressou:

“Ocorre que a norma, aparentemente severa, se converte em ludibrio patente, pois raramente a desaprovação das contas de administrador municipal, por mais ímprobo que seja, acarretará sua inelegibilidade; basta que antes de vir a ser novamente candidato o ex-prefeito, que teve desaprovadas suas contas pela Câmara Municipal segundo o parecer do Tribunal de Contas, ingresse em juízo alegando o que lhe aprouver, para que a inelegibilidade se desfaça, si et em quantum. Dificilmente a decisão da Câmara que tenha rejeitado as contas de prefeito será desconstituída por sentença (...) Quer isto dizer que, quando a ação chegar ao seu desfecho, o ex-prefeito que tenha sido eleito novamente já terá concluído o seu segundo mandato.”

                                Das diversas críticas conhecidas, reputo como das mais eloqüentes, a de outro ex-Ministro do TSE, desta vez Torquato Jardim, no seu festejado “Direito Eleitoral Positivo”:

                                “(..) A alínea g, do mesmo inciso I, art. 1o, ensejou copiosa jurisprudência, provocada pelas múltiplas circunstâncias da sociologia política. O mais lamentável da norma, e de sua jurisprudência conseqüente, é a inexistência de argumento jurídico positivo que permita à Justiça Eleitoral restringir a ressalva excludente da inelegibilidade. O tão-só ajuizamento de uma ação anulatória, a qualquer tempo antes da impugnação do pedido de registro da candidatura, desde que ainda no prazo prescricional de cinco anos (TSE, Ac. 12.674, rel Min. JARDIM, 21.set.92), é o suficiente para afastar a inelegibilidade (Súmula TSE n. 1).

                            Irrelevante o clamor documental da corrupção do candidato; irrelevante o tempo passado entre a rejeição das contas e o ajuizamento da ação não raro longo o bastante para evidenciar o descaso com que o candidato recebera a reprovação. A minoria do Tribunal Superior Eleitoral, forte embora no campo ético, no que todos os juízes concordavam, cedeu ao argumento da maioria, à míngua de um critério legal objetivo que contivesse o subjetivismo do julgador, e, portanto lhe retirasse qualquer nota de arbitrariedade, em especial quanto ao decurso de tempo que pudesse configurar o descaso, e, por conseqüência, a inelegibilidade dos que tiveram suas contas rejeitadas. (..)”

Evidente que a jurisprudência até então “pacífica” em torno da matéria, enfrentava crescente oposição, sobretudo pelos resultados práticos no processo político, tão bem identificados nas críticas em destaque.  Mas é certo também que o sistema adotado, ancorado no julgamento político-administrativo, ainda que o Legislador exija quorum qualificado para deixar de prevalecer o parecer do órgão técnico, iria sofrer alguma revisão; de fato, iria chegar a hora em que o Judiciário Eleitoral se curvaria ao novo momento que o país reclama para o aperfeiçoamento das suas regras, em conformidade com a moralidade pretendida. 

É importante que a nova orientação sumular, seguida da decisão da Corte Maior (STF) no mesmíssimo ano de 2006, é logo recepcionada na Corte Eleitoral, que mais adiante, cristaliza as novas posições, com a edição da lei da ficha limpa. Vejamos pois, que no mesmo ano de 2006, o TSE já decidia:                      
             
“Agravo regimental. Recurso ordinário. Eleições 2006. Registro. Candidato. Deputado federal. Contas. Prefeito. Contas aprovadas pela Câmara Municipal. Convênio. Tribunal de Contas da União. Rejeição. Competência. Ação judicial. Propositura. Fundamentos atacados. Provimento liminar. Ausência. Inelegibilidade. Art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90. Súmula nº 1 do Tribunal Superior Eleitoral. Não-incidência.
1. A competência para julgamento das contas de prefeito é da Câmara Municipal, consistindo o parecer do Tribunal de Contas em peça meramente opinativa.
2. No tocante às contas relativas a convênios, o julgamento da Corte de Contas assume caráter definitivo.
3. Para afastar a inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90, não basta a mera propositura de ação desconstitutiva, antes, faz-se necessário a obtenção de provimento judicial, mesmo em caráter provisório, suspendendo os efeitos da decisão que rejeitou a prestação de contas.
4. O agravo regimental, para que obtenha êxito, deve afastar especificamente os fundamentos da decisão impugnada.
Agravo regimental a que se nega provimento.” (TSE, RO n. 1132ARO - /10/2006Relator(a) CAPUTO BASTOS)

“Agravo regimental. Recurso ordinário. Eleições 2006. Registro. Candidato. Deputado estadual. Contas. Rejeição. Câmara Municipal. Ações judiciais. Propositura. Fundamentos não atacados. Inelegibilidade. Art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90. Configuração.
1. Para que seja suspensa a inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90, não basta a propositura de ação desconstitutiva da decisão que rejeitou as contas, antes, impõe-se a obtenção de provimento, mesmo que liminar, suspendendo os efeitos daquele decisum.
2. Evidencia-se o reconhecimento da insanabilidade, quando a rejeição das contas assenta-se em fraude de licitação, além de outros vícios.
3. O agravo regimental, para que obtenha êxito, deve afastar especificamente os fundamentos da decisão impugnada.
Agravo regimental a que se nega provimento.”(TSE, RO n. 1311/GO, j. em 31/10/2006, Relator Min. CARLOS EDUARDO CAPUTO BASTOS)
 “AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2006. CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL. REGISTRO INDEFERIDO. CONTAS REJEITADAS PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. CONVÊNIO. EX-PREFEITO.
1. Na verdade, o que pretende o recorrente é rediscutir a interpretação dada pela decisão impugnada, no tocante à ressalva contida na parte final da letra g do inciso I do art. 1º da Lei Complementar nº 64/90, bem como ao enunciado sumular nº 1 deste Superior Eleitoral.
2. Não há, nos autos, notícia de provimento judicial definitivo que favoreça o agravante, ou, ao menos, de medida acautelatória que suspenda os efeitos da decisão proferida pelo Tribunal de Contas da União. Provimento cautelar tanto mais necessário quanto se sabe que, em matéria de contas, as decisões do tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo" (§ 3º do art. 71 da Lei Constitucional).
3. A insanabilidade das contas é manifesta, pois as irregularidades detectadas pelo TCU - dispensa indevida de licitação e superfaturamento de preços, entre outras - são faltas graves e que podem - em tese - configurar improbidade administrativa.
4. Não compete à Justiça Eleitoral verificar o acerto ou o desacerto da decisão proferida pela Corte de Contas, mas apenas constatar se estão presentes os requisitos ensejadores da causa de inelegibilidade da alínea g do inciso I do art. 1º da Lei Complementar nº 64/90, quais sejam, contas rejeitadas por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível do órgão competente.
5. Agravo desprovido.” RO-1265 ARO - AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO – MA, j. em 26/10/2006, Relator(a)CARLOS AUGUSTO AYRES DE FREITAS BRITTO)
“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2006. CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL. REGISTRO INDEFERIDO. CONTAS REJEITADAS PELO LEGISLATIVO MUNICIPAL. EX-PREFEITO.
1. Este Superior Eleitoral tem afastado a causa de inelegibilidade da alínea g do inciso I do art. 1º da Lei Complementar nº 64/90 quando há, nos autos, provimento acautelatório que suspenda os efeitos da decisão proferida pela Câmara Municipal, mesmo que tal decisão seja juntada após o pedido de registro de candidatura para as eleições de 2006.
2. Agravo provido.” (TSE, RO n. 1292/MA, j. em 24/10/2006, Relator Min. AYRES DE BRITTO)
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL. REGISTRO INDEFERIDO. CONTAS REJEITADAS PELA CÂMARA LEGISLATIVA E PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. EX-PREFEITO.
1. Os embargos de declaração opostos contra decisão monocrática devem ser recebidos como agravo regimental. Precedentes.
2. Pretensão de rediscutir a interpretação dada pelo acórdão impugnado à ressalva contida na parte final da letra g do inciso I do art. 1º da Lei Complementar nº 64/90, bem como ao enunciado sumular nº 1 deste Superior Eleitoral.
3. Não há, nos autos, notícia de provimento judicial definitivo que favoreça o recorrente, ou, ao menos, de medida acautelatória que suspenda os efeitos das decisões proferidas pela Câmara Municipal e pelo Tribunal de Contas da União. Provimento cautelar tanto mais necessário quanto se sabe que, em matéria de contas, as decisões do tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo" (§ 3º do art. 71 da Lei Constitucional).
4. É assente na jurisprudência pátria que o juiz não está obrigado a responder a todos os argumentos expendidos pelas partes, mas somente aqueles que entender suficientes para a formação do seu livre convencimento.
5. Agravo desprovido.” (TSE, RO 1320/BA j. em 24/10/2006, Relator Min. CARLOS AUGUSTO AYRES DE FREITAS BRITTO)
“ELEIÇÕES 2006. REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO ESTADUAL. IMPUGNAÇÕES. MPE E PMDB/PA. REJEIÇÕES DE CONTAS PELO TCE/PA E PELO TCM/PA. IRREGULARIDADE EM CONVENÇÃO. ACOLHIMENTO DA IMPUGNAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM RAZÃO DAS DECISÕES DO TCE/PA. REGISTRO INDEFERIDO.(..)
- É admissível que a convenção delegue à Comissão Executiva ou a outro órgão partidário a efetiva formação de coligação ou a escolha de candidatos, o que pode ocorrer até o prazo previsto no art. 11 da Lei nº 9.504/97 para se pedir o registro das candidaturas. Precedentes.
- Parecer prévio de Tribunal de Contas dos Municípios não atrai a incidência da inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC nº 64/90. A Câmara Municipal é o Órgão competente para o julgamento das contas anuais de prefeito.
- A competência para o julgamento e eventual rejeição de contas de convênios federais (FUNDEF) é do Tribunal de Contas da União (art. 71, VI, CF).
- O Tribunal Superior Eleitoral revendo o próprio Verbete nº 1 implementou a necessidade de se buscar na ação desconstitutiva a tutela antecipada ou medida liminar. Havendo tal entendimento ocorrido no meio do processo eleitoral, deve ser admitido para essas eleições, a notícia da concessão depois do pedido de registro de candidatura.
- Recurso do candidato provido para deferir o registro da candidatura e desprovido o recurso do partido.”(TSE, RO n. 1329/PA, j. em 24/10/2006, Relator Min. JOSÉ GERARDO GROSSI)


“(..)II- A existência de recurso de reconsideração que não obteve no Tribunal de Contas da União efeito suspensivo não obsta a fluência do prazo de inelegibilidade, o qual ficará suspenso, consoante entendimento jurisprudencial à época dos fatos, com o ajuizamento de ação anulatória na Justiça Comum, voltando a fluir com o trânsito em julgado da decisão que julgou definitivamente o pedido formulado.”  (TSE, RO n. 1172/AL, de 28/11/2006, relator Min. César Asfor Rocha)

“ELEIÇÕES 2006. RECURSO ORDINÁRIO. IMPUGNAÇÃO. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. REJEIÇÃO DE CONTAS. CONVÊNIO FEDERAL. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. COMPETÊNCIA. AÇÃO ANULATÓRIA. AUSÊNCIA DE PROVIMENTO JUDICIAL DE SUSPENSÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO QUE REJEITOU AS CONTAS.1. O Tribunal Superior Eleitoral, revendo o Verbete nº 1 da Súmula de sua jurisprudência, afirmou a necessidade de se obter, na ação desconstitutiva, medida liminar ou a tutela antecipada. Havendo tal entendimento ocorrido no meio do processo eleitoral, deve ser admitida, para as atuais eleições, a notícia da concessão de liminar ou de tutela antecipada, depois do pedido de registro de candidatura.
2. A mera propositura da ação anulatória, sem a obtenção de provimento liminar ou antecipatório, não suspende a cláusula de inelegibilidade da alínea g do inciso I do art. 1º da LC nº 64/90.3. Ausência de notícia de concessão, mesmo posteriormente, de alguma medida judicial.4. Recurso Ordinário conhecido e provido.”(TSE, RO n. 965/MA, de 29/09/2006, relator Min. José Gerardo Grossi)


A partir dessa nova realidade jurídica ou orientação jurisprudencial, digamos, leva-nos a reavaliar a incidência de inelegibilidade de forma mais restritiva, como bem explicou o Ministro Carlos Ayres de Britto, no seu voto condutor, durante o julgamento do RO n.930, de 14.9.2006:

“(..) Este Superior Tribunal assentou que a mera propositura da ação anulatória – mesmo antes da impugnação ao registro – que visa a desconstituir a decisão do Tribunal de contas não suspende por si só a cláusula de inelegibilidade da alínea g do inciso I do artigo 1o da Lei Complementar n. 64/90”.

Esse Efeito suspensivo concedido pelo Judiciário, mesmo concedido durante o período do registro, também é acatado, e permite, ainda no transcorrer do processo eleitoral, que se suspenda a incidente inelegibilidade (TSE, RESPE n. 26640/PR e o RO n. 1329, e já admitindo-se inclusive após o julgamento do registro, através da oposição de embargos de declaração). Nessa mesma linha, destacamos o seguinte aresto, também do Colendo TSE:

“TERCEIROS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ORDINÁRIO. REGISTRO DE CANDIDATURA. REJEIÇÃO DE CONTAS. vício insanável. antecipação de tutela obtida após o julgamento do recurso ordinário. DEFERIMENTO DO REGISTRO DE CANDIDATURA. RESSALVA DO PONTO DE VISTA.1. Em homenagem ao entendimento firmado por esta Corte sobre o tema, há de se conceder os efeitos modificativos buscados, ante a suspensão dos efeitos da Corte de Contas pelo Juízo Federal.2. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes e ressalva do ponto de vista pessoal, para deferir o registro de candidatura do embargante.”(TSE, do RO n. 1263/GO, 21/11/2006, rel. Min. Jose Delgado)”


Importante: Mesmo que a eventual concessão de medida liminar suspenda os efeitos – em via judicial, de uma decisão da Câmara Municipal ou do Legislativo, ou em via administrativa, de uma decisão das Cortes de Contas, lembremo-nos que após os adventos das minirreformas dos anos de 2013 e 2015, pelo Congresso Nacional, o recurso contra a diplomação, previsto no código eleitoral, até três dias após a diplomação, pode ventilar a ocorrência de inelegibilidade superveniente, como por exemplo, o julgamento de um eventual recurso com efeito suspensivo, concedido pelo Judiciário, ou mesmo reversão de um provimento favorável.

Afinal, a revogação da Súmula n. 1 do TSE, para fortalecer as instituições, e a edição posterior da nova redação da alínea “g”, pela lei da ficha limpa, constituiu em verdadeiro aperfeiçoamento do processo eleitoral, através da cognição judicial, se merece o Administrador Público a concessão de liminar permitindo sua participação no pleito, através da propositura de ações ou procedimentos que pelo menos tenham fundamento, causa petendi razoavelmente fundamentada, com a fumaça do bom direito ao lado do autor, diferentemente do regime jurídico anterior, que infelizmente premiava a esperteza, e proporcionava a continuidade da participação de Administradores ímprobos, passando uma péssima mensagem à sociedade brasileira. Não era sem tempo.

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