Aplica-se o princípio da continuidade normativo típica quando uma lei é revogada, mas a conduta nela incriminada é mantida em outro dispositivo legal da lei revogadora, não ocorrendo, via de regra, a conhecida figura da abolitio criminis, a qual extingue, simplesmente, o crime anterior. Em outros termos, o princípio da continuidade normativo típica significa a manutenção do caráter proibido da conduta, contudo, com o deslocamento do conteúdo criminoso para outro tipo penal.
Quando a vontade do legislador é no sentido de que a conduta permaneça criminalizada, não se configura a abolitio criminis. Um dos exemplos mais clássicos disto é o crime de sedução.
O STF tem assim entendido o princípio da "continuidade normativa típica", senão vejamos:
"Abolitio Criminis. Inocorrência. Princípio da continuidade normativo-típica. Precedentes. (...). 1. A jurisprudência desta Suprema Corte alinhou-se no sentido de que, nos moldes do princípio da continuidade normativo-típica, o artigo 3º da Lei nº 9.983/2000 apenas transmudou a base legal de imputação do crime de apropriação indébita previdenciária para o Código Penal (artigo 168-A), não tendo havido alteração na descrição da conduta anteriormente incriminada na Lei nº 8.212/90. (...)" (STF. AI 804466 AgR / SP. Rel. ministro Dias Toffoli. 1ª T. Julg. 13/12/2011). E ainda: "A revogação da lei penal não implica, necessariamente, descriminalização de condutas. Necessária se faz a observância ao princípio da continuidade normativo-típica, a impor a manutenção de condenações dos que infringiram tipos penais da lei revogada quando há, como in casu, correspondência na lei revogadora" (STF. HC 106155 / RJ. rel. p. ac. ministro Luiz Fux. 1ª T. Julg. 4/10/2011).
Claramente, não existe nestes casos, a possibilidade eventual do legislador excluir do ordenamento jurídico a conduta, mas o seu aperfeiçoamento, em uma nova norma, ou no dizer de alguns doutrinadores, um "deslocamento", que não pode se confundir com abolitio criminis, pois esta sim apenas revoga a anterior, excluindo-a do ordenamento jurídico.
Por outro lado, a continuidade normativa típica só pode ocorrer com lei posterior revogadora da anterior, ainda que parcialmente, mas que mantém a tipificação da mesma conduta, inclusive com novas elementares constitutivas do tipo penal em outro dispositivo legal. Não há hiato ou paralisação, sendo inaplicável a lei nova a fatos anteriores à sua vigência, mesmo que entre em vigor apenas um dia pós haver cessado a vigência da anterior, porque isso implicaria na retroatividade de lei penal incriminadora para alcançar fato anterior à sua vigência.
Assim, na admissibilidade do denominado princípio da continuidade normativo típica não há supressão do conteúdo penal de uma norma criminalizadora, isto é, da conduta tipificada em determinado tipo penal, havendo, segundo o entendimento doutrinário-jurisprudencial dominante, apenas a revogação formal do artigo, permanecendo, porém, a proibição penal do mesmo fato típico, apenas em outro dispositivo legal acrescentado pela lei revogadora.
Certamente, a inclusão de elementares típicas que agravem a conduta anterior ou mesmo que ampliem a sua punição, impede, por si só, que se adote o denominado princípio da continuidade normativo típica, ante a irretroatividade do direito penal (inciso, XL do artigo 5° da CF); seria portanto, uma outra infração penal, não se podendo falar em continuidade normativa típica.
Em caso mais recente, normas da revogada Lei de Segurança Nacional - Lei Federal n. 7170, de 1983, foram absorvidos por novos dispositivos pela Lei n. 14.197/2021, como o novo art. 359-L do Código Penal, manejado na denúncia do MPF no caso Daniel Silveira, em recente julgamento no STF; Neste caso, não prosperou a tese que simplesmente defendia a abolitio criminis em relação à condutas da LSN.
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