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ENTENDENDO SOBRE CITAÇÃO E INTIMAÇÃO DE RÉU DOENTE

O recente caso da citação de Bolsonaro por oficial de justiça que ingressou na UTI (unidade de terapia intensiva) colocou em evidência uma discussão sobre a validade do ato, e uma série de postagens nas redes sociais, acerca do que seria ou teria sido mais um episódio de abuso de poder, por promover a citação de um réu - no caso de ação PENAL que tramita no STF, internado em uma unidade hospitalar.

Inicialmente, temos que esclarecer que se trata de uma CITAÇÃO - ato que inicia, que deflagra a tramitação do processo penal. Está disciplinada no Artigo 351 do Código de Processo Penal (CPP), na qual um reu é comunicado, formal e pessoalmente da existência do processo contra si, e o convoca a apresentar DEFESA, a chamada defesa prévia.

Não se confunda a citação, com a intimação, estabelecida no Artigo 370 do mesmo CPP, para o fim de comunicar ao réu e seus defendentes quaisquer atos, decisões ou mesmo diligências processuais tomadas no curso do mesmo processo.

O fato é que o CPP não disciplina expressa de restringir a citação a réu adoentado, mas quem o faz, de forma clara é o Código de Processo Civil, nos Artigos 243 e 244, que tratam da citação em diversos locais e estabeleceu impedimento em casos de estado grave de saúde.

Segundo o Art. 244, IV, não se deve realizar citação (pode-se analogicamente entender que tambem cabe a intimação) de pessoa que esteja em estado grave de saúde, exceto para evitar o perecimento do direito.

Destaque-se que, no presente caso, o Código de Processo Civil (CPC) há de ser aplicado subsidiariamente ao processo penal, como autoriza o art. 3º do CPP em conjunto com o art. 15 do CPC.

A norma visa proteger a dignidade do indivíduo, que, vulnerável, não tenha capacidade de compreender e de reagir. É portanto, necessário, que se ateste a GRAVIDADE do estado de saúde, mas a gravidade DEVE AFETAR a compreensão e a capacidade COGNITIVA do réu. 

A jurisprudência é pacífica nestes casos, quando por exemplo, considerou válida citação de réu internado com esclerose múltipla em estado que não era considerado grave, no sentido de afetar os sentidos ou outros, nos quais fica ou não evidenciada a capacidade de "compreender os acontecimentos".

No caso de Bolsonaro, embora estivesse em uma UTI após ser submetido a cirurgia de grande porte poucos dias antes, o Ministro Alexandre de Moraes considerou que a realização voluntária de uma Live em rede social, transmitida publicamente, e que teve longa duração seria prova inconteste de que estava lúcido e apto para compreender satisfatoriamente, apto para receber a citação. O próprio comportamento do réu afastou a presunção do conceito de que a "gravidade" da doença o afetava.

O réu tambem deu entrevista para o SBT, demonstrando da mesma forma, compreensão e lucidez, e cognição para tanto.

A regra que veda citação/intimação de doente em estado grave não é absoluta, e pode ser relativizada quando houver evidência de que o quadro clínico não compromete a consciência do ato. Assim, embora o hospital ainda não tivesse autorizado visitas e não houvesse previsão de alta, o ato voluntário de comunicação pública via internet se transformou, paradoxalmente, em argumento processual contra o próprio réu.













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