Empresas estatais e as Sociedades de economia mista sem lucro são beneficiárias de imunidade tributária recíproca
Apesar da simples leitura do rol taxativo aos entes que fazem jus à imunidade tributária recíproca, de acordo com a literalidade do artio 150, VI, da CF não prever a inclusão das sociedades de economia mista, e devido à realidade operacional da Administração Pública fazer ver, por uso da principiologia, que cabia a extensão às empresas públicas e as sociedades de economia mista, a Suprema Corte foi por diversas vezes demandada a assentar neste caso uma interpretação extensiva do instituto da imunidade tributária.
De fato, por unanimidade, muito recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou jurisprudência de que as empresas públicas e as sociedades de economia mista, delegatárias de serviços públicos essenciais, são beneficiárias de imunidade tributária recíproca, independentemente de cobrança de tarifa como contraprestação do serviço. A decisão foi proferida no Recurso Extraordinário (RE) 1320054, desta vez com repercussão geral (Tema 1.140); Segundo o entendimento da Corte, o benefício, previsto na Constituição Federal (artigo 150, inciso VI, alínea “a”), é concedido quando não houver distribuição de lucros a acionistas privados e nos casos de ausência de risco ao equilíbrio concorrencial.
No RE, o Município de São Paulo (SP) questionava decisão do Tribunal de Justiça local (TJ-SP) que concedeu à Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô-SP) imunidade tributária recíproca ao pagamento de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). O município argumentava que o dispositivo constitucional que prevê o benefício traz o rol taxativo dos entes imunes e que a Constituição (parágrafos 1º e 2º do artigo 173) veda a concessão de benefícios fiscais às empresas públicas e sociedades de economia mista.
Em relação ao mérito, o ministro relator entendeu que o Metrô-SP, sociedade de economia mista que tem por objeto a exploração de serviço público essencial de transporte público de passageiros mediante o pagamento de tarifa, tem direito à imunidade recíproca; Segundo o relator, a extensão do benefício está de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal; Nesse sentido, citou o ARE 1080256 e os REs 905900 e 342314, entre outros, ao quais adicionam-se diversas decisões anteriores da Corte Maior, como o:ARE 1.311.571, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 18/3/2021; ARE 1.311.635, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 17/3/2021; ARE 1.308.894, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 1º/3/2021; ARE 1.308.380, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 26/2/2021; ARE 1.292.665, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 10/11/2020; e ARE 1.091.568, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 20/11/2019.
Destaco, em especial, a ementa fixada no julgado da ARE 1080256, de recente lavra, mas anterior ao novo julgado pelo Colendo STF, de repercussão geral:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO - CPTM - SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA INCUMBIDA DE EXECUTAR, COMO ATIVIDADE-FIM, EM FUNÇÃO DE SUA ESPECÍFICA DESTINAÇÃO INSTITUCIONAL, SERVIÇOS DE TRANSPORTE FERROVIÁRIO - CPTM COMO INSTRUMENTALIDADE ADMINISTRATIVA DO ENTE FEDERADO, INCUMBIDA, NESSA CONDIÇÃO INSTITUCIONAL, DE EXECUTAR TÍPICO SERVIÇO PÚBLICO - CONSEQUENTE EXTENSÃO, A ESSA EMPRESA GOVERNAMENTAL, EM MATÉRIA DE IMPOSTOS, DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL FUNDADA NA GARANTIA DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA (CF, ART. 150, VI, ‘a’) - O ALTO SIGNIFICADO POLÍTICO-JURÍDICO DESSA GARANTIA CONSTITUCIONAL, QUE TRADUZ UMA DAS PROJEÇÕES CONCRETIZADORAS DO POSTULADO DA FEDERAÇÃO - IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DA CPTM, EM FACE DO IPTU, QUANTO ÀS ATIVIDADES EXECUTADAS NO DESEMPENHO DO ENCARGO, QUE A ELA FOI OUTORGADO - DOUTRINA - JURISPRUDÊNCIA - PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - SUCUMBÊNCIA RECURSAL - MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA - PRECEDENTE (PLENO) - NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DOS LIMITES ESTABELECIDOS NO ART. 85, §§ 2º E 3º DO CPC - AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.” (ARE 1.080.256-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJe de 15/5/2020, grifei)
“DIREITO TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA DELEGATÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. EXTENSÃO. POSSIBILIDADE
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal se consolidou no sentido de que as empresas públicas e sociedades de economia mista delegatárias de serviços públicos de prestação obrigatória e exclusiva do Estado são beneficiárias da imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal. Precedentes.
2. Inaplicável o art. 85, § 11, do CPC/2015, uma vez que não houve fixação de honorários advocatícios contra o recorrente.
3. Agravo interno a que se nega provimento.” (RE 905.900-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe de 14/12/2020, grifei).
De fato, esta não é a primeira vez que o STF relativiza seus próprios requisitos para concessão de imunidade tributária. Outra decisão da Corte Máxima a destacar-se foi a de 2018, quando foi reconhecida a imunidade tributária recíproca ao Serpro, empresa pública que atua no segmento de processamento de dados e prestação de serviços de tecnologia (ACO 2.658). O entendimento que prevaleceu na corte constitucional foi o de que o Serpro, ao prestar serviços de tratamento de informações e de processamento de dados que visam a modernizar e dar agilidade a setores estratégicos da Administração Pública, com exclusividade, estaria apto a gozar de imunidade tributária.
Analisando-se a jurisprudência do STF, fica a impressão de que os requisitos vêm sendo aplicados de forma bastante flexível. Critérios até então objetivos têm sido relativizados para contemplar algumas situações específicas e excepcionais.
Daí que tendo a necessidade de racionalmente, utilizar o sistema de precedentes qualificados, o STF, atuando como corte constitucional, sepultando-se quaisquer controvérsias, inclusive em função de múltiplas decisões sobre a mesma controvérsia, assentou-se, afinal, a tese de repercussão geral.
Afinal, a tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “As empresas públicas e as sociedades de economia mista delegatárias de serviços públicos essenciais, que não distribuam lucros a acionistas privados nem ofereçam risco ao equilíbrio concorrencial, são beneficiárias da imunidade tributária recíproca prevista no artigo 150, VI, ‘a’, da Constituição Federal, independentemente de cobrança de tarifa como contraprestação do serviço”.
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